O Brasil é um dos maiores produtores de grãos do mundo, mas ainda apresenta um sistema de armazenamento insuficiente, com uma capacidade estática capaz de armazenar cerca de 60% de uma única safra. Esse problema foi tema de debate, na última segunda-feira (1/3), em reunião do Conselho Superior do Agronegócio (Cosag) da Fiesp. O Vice-presidente da Aciub e Conselheiro do Cosag, Sérgio Tannus, participou da reunião, em São Paulo.
“A falta de armazenagem não deixa que o produtor aguarde as melhores oportunidades para comercialização de seus produtos e não permite um fornecimento uniforme de alimentos ao longo do ano”, alertou o presidente do Cosag, Jacyr Costa.
A relevância da armazenagem adequada e as soluções para a questão, que é crítica no Brasil, foram abordadas por Luiz Lourenço, presidente do Conselho de Administração da Cooperativa Agroindustrial (Cocamar) e conselheiro do Sindicato e Organização das Cooperativas do estado do Paraná (Ocepar).
De acordo com ele, o armazenamento inadequado de grãos resulta em perdas de cerca de 15% para o produtor. Além disso, a armazenagem é importante para manter as características dos grãos após a colheita e a secagem. “Falta de infraestrutura física de armazenagem e de transporte, armazéns antigos com estrutura dos anos 1960 e armazéns subutilizados ou abandonados são entraves para um bom atendimento e reduzem as margens de lucro do produtor”, diz Lourenço.
Segundo ele, os principais benefícios da armazenagem para a agricultura são: coordenação entre oferta e demanda, controle da sazonalidade, garantia de suprimento, gestão da comercialização e maior rentabilidade do produtor, redução das filas de caminhões, redução da armazenagem a céu aberto e prolongamento do escoamento da safra.
Já Paulo Bertolini, presidente da Câmara Setorial de Armazenagem da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), trouxe dados que apontam que o Brasil precisaria investir R$ 15 bilhões em armazéns, todos os anos, para dar conta do aumento da produção agrícola e impedir o déficit.
Bertolini diz que, hoje, a produção estimada de grãos no Brasil é de 320 milhões de toneladas, e o país consegue estocar, no máximo, 201 milhões de toneladas. Ou seja, há um déficit de 119 milhões de toneladas (37%).
De acordo com ele, o problema da armazenagem estática brasileira é que ela não está no lugar certo. Do total existente, 84% estão em áreas urbanas e industriais e apenas 16% nos locais de produção, ou seja, nas fazendas.
Ele cita alguns benefícios da armazenagem de grãos na fazenda: aproveitamento total do produto, inclusive resíduos e grãos quebrados; maior rendimento na operação de colheita, por evitar espera do retorno dos caminhões presos nas filas das unidades coletoras; e garantia de qualidade do produto colhido, sendo conservado conforme os propósitos do produtor.
“Nos Estados Unidos, nosso principal concorrente, 66% da capacidade estática de armazenagem de grãos estão dentro das fazendas”, diz Bertolini, ressaltando que eles conseguem armazenar mais do que uma safra inteira. “No Brasil, a armazenagem de grãos está à beira do caos”, afirma.
O programa de financiamento de armazéns nos Estados Unidos também se beneficia dos juros baixos: 3,75% ao ano com prazo de empréstimo de até 12 anos, enquanto no Brasil os juros anuais estão em torno de 7% a 8,5% com prazo de empréstimo de até 12 anos. “Juros quase 2 vezes superiores aos praticados nos Estados Unidos para a mesma finalidade”, destaca Bertolini.
Outra visão sobre o tema foi trazida por Piero Abbondi, CEO da Kepler Weber, empresa que tem entre suas políticas de gestão desenvolver soluções inovadoras para o pós-colheita.
Abbondi disse que, se o país não tem armazenagem adequada, os preços flutuam de maneira abrupta. “Uma boa armazenagem suaviza o preço do produto privilegiando o produtor e o consumidor”, diz ele. “A segurança alimentar está no cerne da questão, precisamos pensar no nosso cliente, que é o produtor, mas também na sociedade”, enfatizou.
Os representantes do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Alexandre Abreu, diretor Financeiro e de Crédito Digital para as MPMEs (micro, pequenas e médias empresas) e Caio Barbosa, chefe do Departamento de Crédito Rural, trataram de financiamento para armazenagem. Eles informaram que o BNDES tem uma linha de crédito especial para produtores rurais independentes, dispostos a financiar a construção de silos na própria fazenda. Em 2022, o banco financiou quatro projetos e, em 2023, foram treze.
Segundo Abreu, em 2023, o BNDES mais que triplicou o número de operações para financiar novas estruturas de armazenagem de grãos no país. O banco emprestou cerca de R$ 1,7 bilhão no âmbito do Plano Safra 2023/2024 em programas com foco em armazenagem, como o Programa para Construção e Ampliação de Armazéns (PCA). Ele reconhece, porém, que “não atende plenamente às necessidades do país”.
Ele citou outra linha de crédito que pode ser uma alternativa para o produtor rural, a Taxa Fixa do BNDES em Dólar (TFBD), que oferece uma opção de financiamento com custo atrelado à variação cambial, mas que é vantajoso só para clientes que têm receitas atreladas ao dólar.
Já o secretário de Agricultura e Abastecimento do estado de São Paulo, Guilherme Piai, disse como o governo paulista pretende enfrentar o problema de armazenagem. “Para além do Plano Estadual de Irrigação que lançaremos na Agrishow desse ano, a Secretaria irá lançar o primeiro blended finance (financiamento misto) que terá aporte da iniciativa privada e do poder público, com apoio do mercado de capitais, da Desenvolve SP e do Fundo de Expansão do Agronegócio Paulista (FEAP), vinculado à Pasta da Agricultura”, contou.
Segundo ele, desta forma, o produtor rural terá à disposição financiamento com taxas equalizadas, de maneira a garantir a rentabilidade de seus investimentos e a necessária adequação da infraestrutura da propriedade no que diz respeito à armazenagem.
Via: Lúcia Rodrigues, Agência Indusnet Fiesp / Adaptado